Eu tenho um problema sério com esse papinho de “Hardcore x Casual”. Isso começou na época da sétima geração de consoles, com o sucesso da filosofia de acessibilidade promovida pelo Nintendo Wii, o boom dos jogos em Flash e sua consolidação nas redes sociais, e o início da ascenção do smartphone como plataforma para jogos.
Era uma época na qual os criadores de jogos começavam a explorar e expandir seu mercado para todo um novo público. E foi justamente nessa época que se criou essa falácia elitista de dividir o público consumidor de videogame entre “jogadores casuais” – que supostamente não se dedicam muito ao hobby e só querem uma diversão fácil, boba e de qualidade questionável – e “jogadores hardcore” – que supostamente são fissurados em games, jogam sempre até o limite das suas habilidades, querem desafio acima de tudo e só se contentam com o que há de mais vistoso e rebuscado no mercado.
Não vou me demorar nesse assunto porque não é esse o objetivo do post de hoje. Apenas vou deixar este vídeo do Extra Credits (que é de 2016 mas, ao meu ver, continua bastante atual), que ilustra bem o que eu penso sobre essa falsa dicotomia:
De qualquer forma, eu precisei tocar nesse assunto para que você que está lendo este texto entenda porque a minha primeira impressão ao ouvir falar do jogo Hardcore Maze Cube, desenvolvido pelo pessoal do YAW Studios, não foi das melhores. É claro que aceitei de boa vontade uma cópia do jogo para experimentá-lo e falar sobre ele aqui (de forma alguma eu deixaria de jogar um jogo só por causa disso), mas quando eu visitei a página do Steam e li sua sinopse, com todo aquela conversa enjoada de “somente a elite dos jogadores conseguirá chegar ao final” e “não damos dicas, nem tutoriais e você vai ter que se virar sozinho”, eu pensei: “que bixiga é isso?! Voltamos a 2006?!”.
Felizmente esse é mais um daqueles exemplos de que não se deve julgar um livro pela capa. Hardcore Maze Cube conseguiu me propor desafios bem interessantes com sua criativa proposta de puzzles labirínticos com uma dificuldade justa e muito bem dosada, apesar do seu cômico esforço para se passar por “um jogo fodão voltado somente pra quem é hardcore”.
Explorando o desconhecido
Seguindo uma pegada bem arcade, Hardcore Maze Cube consiste em uma sequência de labirintos escuros, sombrios e cheios de armadilhas, obstáculos e, em alguns deles, criaturas malignas. Os labirintos são vistos de cima, com preto e tons de cinza bem escuros dando um ar tenebroso ao jogo, ar esse que é complementado por uma música de terror suave e que inspira um clima bem tenso.
O jogador precisa controlar uma criaturinha chamada somente de “o Cubo”, que mais parece um fantasminha preto e quadrado e deve explorar o labirinto para encontrar uma saída – e, é claro, escapar com vida no processo. No final do caminho, o jogador precisará responder a um enigma imposto por uma entidade mágica chamada “Matriz Cúbica”. Caso acerte a resposta, avança para o próximo labirinto; caso erre, perde uma vida e deve recomeçar a exploração.
Mas não pense que isso será tarefa fácil: todos os labirintos são engenhosamente projetados para dificultar sua exploração, com armadílhas visíveis e algumas delas escondidas, posicionadas da maneira mais agressiva e sacana possível para te oferecer uma morte certa.
Além disso, cada labirinto pode ter mudanças ambientais que complementam o desafio, como por exemplo uma luminosidade ambiente reduzida (o que te obriga a depender de uma fonte de luz controlada com o ponteiro do mouse para enxergar o caminho).
Me desgraçando da cabeça
Descrevendo dessa maneira, pode parecer que Hardcore Maze Cube é apenas mais um jogo arcade comum como vários outros, cuja dificuldade elevada pode ser transposta na base da tentativa e erro. E, de certa forma, isso ainda é verdade. Mas esse jogo faz alguns pequenos truques para sabotar até mesmo a memória do jogador, dando um toque a mais nos desafios a serem superados e deixando a experiência mais interessante.
Por exemplo: com pouquíssimas exceções, os itens coletáveis ficam ocultos e só aparecem na tela quando o jogador se aproxima deles. Eles nunca mudam de lugar (tudo tem limite, né?), mas apenas o fato de eles não estarem visíveis na tela em 100% do tempo é o bastante (pelo menos para mim) para tornar a tarefa de memorizar sua localização um tanto mais custosa.
Além disso, também tem o momento da resolução dos enigmas impostos ao jogador: alguns desses enigmas envolvem prestar atenção em trios de símbolos desenhados no cenário e posteriormente tentar adivinhar a ordem correta de posição dos mesmos, de acordo com uma lógica que você precisa deduzir.
Acontece que o jogo sempre mistura a posição dos símbolos na hora de o jogador responder o enigma (mas nunca são misturados no labirinto. Lá a posição dos símbolos é sempre fixa), impedindo que decoremos uma ordem fixa para selecionar os símbolos e dar nossa resposta. Isso nos força a não só prestar muita atenção aos detalhes do cenário, como também prestar atenção no momento de responder os enigmas que envolvem símbolos.
Dificuldade justa, apesar de tudo
Lembra de quando eu falei no começo desse texto que li a sinopse do jogo e achei simplesmente ridículo todo aquele papinho de “somente pra elite”, “sem tutoriais nem dicas” e bla bla bla? Pois é, agora eu admito que o ridículo fui eu, porque após jogar algumas horas deste jogo, posso afirmar sem medo de errar: É TUDO MENTIRA!
Obviamente Hardcore Maze Cube é sim um jogo bem difícil, com uma curva de aprendizado bem mais íngreme do que os outros puzzles disponíveis no mercado. Entretanto, os desenvolvedores do YAW Studios souberam criar uma primeira impressão de jogo punitivo, mas que na verdade é sim bastante amigável de aprender.
Hardcore Maze Cube é o tipo de jogo que te faz aprender uma maneira de jogar e depois testa seu aprendizado com desafios que vão progredindo gradativamente, a cada labirinto novo acessado. A eventual necessidade de insistir e apelar para a tentativa e erro não chega a ser frustrante e uma vez que você consegue superar os desafios pela primeira vez, vai conseguir superá-los novamente com mais facilidade, caso dê game over em algum momento.
Além disso, Hardcore Maze Cube ajuda ao jogador iniciante o tempo todo, como qualquer jogo de hoje em dia faria. Instruções de como controlar o personagem (seja com o controle, seja com teclado e mouse), descrições das mecânicas do jogo e outras informações úteis aparecem na maioria das telas de loading. Além disso, quando você começa uma nova partida no modo Aventura, a própria entidade que impõe os desafios explica com detalhes como o jogo funciona.
Se isso não é tutorial eu não sei o que é!
O Tsundere dos games
No âmbito dos mangás e animes, Tsundere é um arquétipo de personagem que é mal humorado, agressivo e zangado à primeira vista, mas se que mostra carinhoso e amável caso você se aproxime dele e o conheça melhor.
Isso é bem a cara de Hardcore Maze Cube. Apesar de sua primeira impressão se esforçar para demonstrar o contrário, esse jogo tem todas as qualidades para agradar todo tipo de jogador, não apenas os veteranos. Com labirintos e puzzles bem elaborados, um personagem carismático e modos de jogo variados, Hardcore Maze Cube é mais uma excelente opção de diversão.
HARDCORE MAZE CUBE
Plataforma avaliada: PC/Windows | Desenvolvedor: YAW Studios | Publisher: Nenhum | Gênero(s): Ação, Puzzle
Hardcore Maze Cube está disponível para PC, nos sistemas operacionais Windows e macOS, à venda do Steam.
Esta resenha foi elaborada com uma cópia do jogo gentimente cedida pelos desenvolvedores.